quarta-feira, 20 de julho de 2011

"Dona" Maria

Quem vê a foto que repousa sobre o porta retrato de metal, logo me pergunta: Onde você tirou essa foto com cara de antiga?
Acabo por explicar que aquela é minha avó Maria no auge dos seus 19 anos, com minha tia mais velha no colo e o meu vô Manoel ao lado, em sua pose de patriaca da família.

Todos se surpreendem com a resposta, e alguns realmente não acreditam quando explico, devido à incrível semelhança física entre eu e minha falecida avózinha, a quem carinhosamente chamo de "Dona Maria". Parecemos gêmeas. Se ela não tivesse falecido quando eu tinha sete anos de idade, talvez pudessem jurar que eu sou a reencarnação dela. rs. São somente os genes lusitanos, pessoas, nada mais. rs Talvez, almas ancestrais demais.

Dona Maria foi-se para o outro mundo quando eu tinha somente sete anos. Mas lembro como se fosse ontem. Todas as poucas lembranças que tenho dela me são vívidas na mente, como se eu as revivesse toda vez que estas lembranças retornam.

Conforme os anos se passaram, e histórias pós-mortem me foram contadas, parece que novas lembranças surgiram, ou talvez foram por mim criadas.

Dona Maria, mãe de sete filhas, o oitavo, Manoel Lúcio, faleceu ainda bebê. Profissão: mãe. Somente quando o marido se acidentou no seu trabalho de estivador é que ela saiu pra trabalhar para poder sustentar a casa. Recrutou as duas filhas mais velhas para trabalharem também. As mais novas, ficavam em casa, cuidando umas das outras. Nessa época, minha mãe nascia. Não me foi explicado se minha mãe, ainda bebê, ficava em casa aos cuidados das irmãs ou se ia "trabalhar" com a mãe. Só me foi explicado que meu vô só saiu do hospital quando minha mãe já tinha 6 meses de idade, e que mesmo em casa, meu vô continuava acamado.

Dona Maria morava num chalé no morro, com árvores no quintal, um terreno próprio ao lado com coqueiro, bananeira, mangueira e a inesquecível caramboleira. Tinha ervas plantadas e criava galinhas. Sua mãe era católica e levava suas filhas todo domingo à missa. Ela, porém, aprendeu o segredo das ervas com sua madrinha. Curava sapinho das crianças das redondezas com uma mistura de cinzas e azeite de oliva. Benzia e fazia uso de suas ervas. E cozinhava coisas mágicas, que ninguém da família soube fazer igual, mesmo seguindo a receita à risca. Suas especialidades (pelo menos pra mim) eram Canja de galinha e sagu de vinho. Eu me deliciava. Tenho poucas lembranças dela, mas lembranças que me mostraram quem sou. E sim, também tivemos diversos contatos pós-passagem que contarei mais pra frente. Dona Maria usava vestidos na altura do joelho, em sua grande maioria costurados por uma de suas filhas, a mais talentosa pra costura: Teresa. Dona Maria também usava brincos arredondados de ouro, e não os tirava da orelha. Gostava de perfumes de alfazema. Tinha belas rugas e era um pouco corcunda. Tinha uma serenidade no olhar e um sorriso de canto de boca mágico. Lembro-me de uma vez, presenciar a feitura de seu coque. Ela tinha cabelos longuíssimos, com poucos fios brancos, no auge de seus sessenta e poucos anos. E prendia-os num coque perfeito. Num fim de tarde, acompanhava-a no jardim de sua casa. Ela soltou os cabelos para refazer o coque. Refez-os num belíssimo ritual, com grampos na boca e olhares sorridentes endereçados a mim. Talvez achando graça da curiosidade da neta baixinha, olhando pra cima, pra senhora alta enrolando seus cabelos num coque no topo da cabeça. Lembro do sol batendo no pinheiro. Lembro do sol do sorriso dela. Talvez foi essa lembrança que me fez passar a usar coque. Uso-os a muitos anos e nem me recordo mais quando comecei a usá-los. E todos na família dizem que ao prender o cabelo em coque, fico mais e mais parecida com Dona Maria. Minha vó benzedeira. Minha gêmea. Minha senhora.

Escreverei mais sobre ela numa outra hora... :) rs

Namastê, meus caros!

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